Correio Braziliense
22/10/2008
Mundo
Especialistas descobrem que o consumo de carne, sal e frituras amplia em 30% o risco de enfarte. Tofu e soja não causam mal
Rodrigo Craveiro
Da equipe do Correio
"Diga-me o que você come e eu direi quem você é." A frase tornou famoso o francês Jean Anthelme Brillat-Savarin - autor de A fisiologia do gosto e amante da gastronomia. Decorridos 182 anos de sua morte, as palavras desse advogado de certa forma ainda ressoam na ciência moderna. Médicos e estatísticos da McMaster University, em Hamilton (Canadá), acabam de confirmar que a dieta oriental, baseada no consumo freqüente de tofu (queijo de soja) e molho de soja, não tem efeito no risco de ataque cardíaco.
Por outro lado, os adeptos do estilo ocidental de dieta apresentam 30% mais chances de sofrer um enfarte, em comparação com a população em geral. "Acreditamos que isso ocorra pelo fato de essas pessoas comerem mais alimentos com excesso de sal, frituras e carnes", explicou ao Correio, por telefone, o indiano Salim Yusuf, diretor do Instituto de Pesquisas e Saúde da População da McMaster University e principal autor do estudo publicado na revista científica Circulation: Journal of the American Heart Association.
Yusuf e outros nove especialistas de Omã, Hungria, Paquistão, China e Zimbábue analisaram os dados obtidos pelo estudo Interheart, uma investigação padronizada que envolveu 16.407 adultos entre 53 e 57 anos de 52 países diferentes. Depois de aplicarem um questionário e criarem um placar associando o enfarte à alimentação, eles concluíram ainda que os seguidores da dieta ocidental tiveram 35% mais riscos de sofrer um ataque cardíaco do que aqueles que comiam pouca ou nenhuma fritura ou carne (dieta prudente). "Estudamos pacientes na Colômbia, Brasil, Chile e Argentina e, de modo geral, percebemos um aumento no perigo de enfarte em toda a América do Sul, tendência seguida pela América do Norte", comentou o indiano.
Surpresa
Já era consenso na medicina que a dieta ocidental está bastante ligada a doenças cardíacas. Isso se explica pelo fato de o sal aumentar a pressão e a gordura bloquear os vasos sangüíneos. Pela primeira vez, os cientistas quantificaram as chances de uma pessoa que se alimenta mal enfartar. Outra categoria de dieta considerada pela pesquisa é chamada de prudente. "Ainda não sabemos porque esse tipo de alimentação costuma ser mais benéfico, mas a resposta pode estar em um maior consumo de frutas e vegetais", disse Yusuf.
O risco "neutro" associado à dieta oriental surpreendeu os cientistas, que esperavam testemunhar mais benefícios da comida asiática. A explicação pode estar na alta concentração de sódio na soja e em outros molhos. A substância aumenta a pressão sangüínea e realiza a função inversa de componentes que protegem de doenças cardíacas. No estudo liderado pelo dr. Yusuf, o grupo que consumiu o mais alto nível de frutas e vegetais se adaptou a comer esse tipo de alimentos todos os dias. Os especialistas recomendam que adultos entre 19 e 50 anos se sirvam de sete a 10 porções diárias de frutas e verduras, enquanto adultos acima de 51 anos comam até sete porções. Por ano, o enfarte atinge cerca de 300 mil brasileiros - 58 mil deles acabam por morrer.
A PESQUISA
# Os cientistas analisaram o estudo INTERHEART, que abrange 16 mil pessoas de 52 países. Eles estudaram 5.761 casos de enfarte e compararam esses pacientes a 10.646 pessoas sem doenças cardíacas # Os pesquisadores criaram um placar de risco para pacientes enfartados, baseados em 19 grupos alimentares e o ajustaram à preferência alimentar em cada país
MODELOS DE DIETAS
# Oriental: grande quantidade de tofu (queijo de soja), soja e outros molhos
# Prudente: grande quantidade de frutas e vegetais
# Ocidental: grande quantidade de alimentos fritos, lanches salgados, ovos e carne
CONCLUSÕES
# Pessoas que consumiram a "dieta prudente" tiveram 30% menos chances de sofrer um enfarte, em comparação com pessoas que comem pouca ou nenhuma fruta ou vegetais
# Os adeptos da dieta ocidental têm 35% mais riscos de ter um ataque cardíaco, comparado com pessoas que consomem pouco ou nada de carne e alimentos fritos
# O padrão oriental de dieta não mostrou relação com o risco de enfarte